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01/11/2021 - A doença que fazia os escravizados no Brasil tirarem a própria vida

29/10/2021
 
No século 19, o índice de “mortes voluntárias” entre escravizados, quando comparado ao de homens livres, era duas ou três vezes mais elevado
 
No dia 22 de junho de 1872, o Jornal do Commercio, no Rio de Janeiro, publicou uma nota chocante, que revelava uma faceta pouco conhecida da escravidão: os escravos se suicidavam. E o índice de “mortes voluntárias” entre eles, quando comparado ao de homens livres, era duas ou três vezes mais elevado.

“Apareceu ontem enforcado com um baraço [corda de fios de linho], dentro de um alçapão, na casa da rua da Alfândega, nº 376, sobrado, o preto Dionysio, escravo de D. Olimpya Theodora de Souza, moradora na mesma casa. O infeliz preto, querendo sem dúvida apressar a morte, fizera com uma thesoura pequenos ferimentos no braço”, dizia a trágica nota, narrando os últimos atos do homem.

Em 1799, Luiz António de Oliveira Mendes apresentou, na Academia Real de Ciências de Lisboa, um estudo sobre “as doenças agudas e crônicas que mais frequentemente acometem os pretos recém-tirados da África”.

Os sintomas? Os escravos ficavam entristecidos, paravam de falar e, acima de tudo, deixavam de se alimentar, mesmo “oferecendo-se-lhes” — afirma o médico — “as melhores comidas, assim do nosso trato e costume, como as do seu país…”, falecendo pouco tempo depois. Sintomas muito parecidos com o que chamamos hoje de “depressão“. Na época, chamavam de “banzo”.

No século 19, com o desenvolvimento das primeiras teorias psicológicas, o comportamento dos escravos banzeiros foi reconhecido como distúrbio mental. Em 1844, Joaquim Manoel de Macedo, na tese médica intitulada Considerações Sobre a Nostalgia, afirma o seguinte: “estamos convencidos de que a espantosa mortandade que entre nós se observa nos africanos, principalmente nos recém-chegados, bem como de que o número de suicídios que entre eles se conta, tem seu tanto de dívida a nostalgia”.

Aos poucos, a associação entre nostalgia e banzo se tornou popular. No Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, de 1875, de Joaquim de Macedo Soares, é possível ler a seguinte definição: “banzar: estar pensativo sobre qualquer caso; triste sem saber de quê; sofrer do ‘spleen’ dos ingleses; tristeza e apatia simultânea; sofrer de nostalgia, como os negros da Costa quando vinham para cá, e ainda depois de cá estarem”.

Hoje, a palavra “nostalgia”, difundida na literatura, é sinônimo de “saudade”, um sentimento. Situação bem diferente é pensá-la como doença. Tal rótulo provavelmente encobria uma vasta gama de problemas psicológicos ou psiquiátricos, que iam da depressão à esquizofrenia; ou eram provocados pela desnutrição e por doenças contagiosas.

Como todos os testemunhos do passado, os textos acima devem ser lidos com olhos críticos: o registro de suicídio pode encobrir assassinatos praticados por senhores.

A tristeza que os escravizados carregavam ao serem retirados de seu país, perderem suas identidades, e a humilhação e os castigos que sofriam também pode explicar o alto número de suicídio entre os escravizados da época no Brasil.


Fonte: Aventuras na História


Fonte: OBSERVATÓRIO DO TERCEIRO SETOR



 
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